segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Ética Profissional – Análise Crítica

SÁ, Antônio Lopes. Ética Profissional. 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 1998. P. 137 – 180
Ética Profissional
A ética aparece quando a relação com o outro existe, desde quando o homem passou a viver em comunidade. Neste contexto de comunidade surge a necessidade de administrar a relação entre os homens devido à vontade e desejo inerentes ao próprio ser humano. A ação que busca a satisfação do desejo deverá ser uma ação que cuide e preserve a relação entre os seres humanos. Esse ser político, que vive em conexão, é atuante, sempre em movimento em busca de sua satisfação, ou como quer Aristóteles, o bem. Esse bem deve ser necessariamente aquele que alcança a todos, senão não é bem.
Não obstante, toda ação é comandada pela mente, havendo uma contínua tensão entre o que Aristóteles chama de parte privada da razão (manutenção e preservação) e a parte racional (pensamento). Nossas ações recebem interferência de nossa necessidade de manutenção e de nosso desejo de preservar a própria existência (residentes na parte privada de razão), além de receber influência também do pensamento. A solução desta tensão está em fazer com que a parte racional se sobreponha à parte privada de razão, buscando o justo meio entre o excesso e a falta quando da escolha da conduta para satisfação do desejo. Na medida em que minha conduta é orientada pelas virtudes éticas, ajo com excelência. Excelência e virtude são sinônimas para Aristóteles.
Se, para Aristóteles, bem é toda atividade realizada com excelência, então, quando um pedagogo organizacional exerce sua função envidando todos os esforços para desenvolver um processo de aprendizagem continuada e treinamento de uma equipe, ele (pedagogo) somente agirá eticamente se sua conduta for excelente, ou segundo a linguagem aristotélica, virtuosa.
Para Sá, o próprio momento de escolha ou eleição do trabalho a ser executado demonstra ato consciente do profissional, ou seja, trata-se de tarefa que considera ser “realmente, a desejável, a condizente com o que nos apraz, e se possuímos pendor para realizá-la”(137). Toda atividade profissional implica em se ter conhecimento sobre o fazer da profissão, estudo e dedicação são pré-requisitos da ação profissional. A eleição da tarefa deve ser natural, espontânea, em conformidade com o conjunto de aptidões inatas ou aperfeiçoadas, observando o crescimento do profissional teórica e empiricamente. Deve saber fazer, e fazer com excelência. Não basta então ser pedagogo, especialista legalmente habilitado. Não basta conhecer apenas o que está diretamente ligado à sua tarefa, mas requer-se que o profissional tenha “pleno domínio sobre tudo o que é abrangido pela tarefa que se encontra sob a responsabilidade direta” (140).
Há um grave problema quando a pessoa não tem conhecimento para fazer determinada tarefa mais insiste em fazê-la. A relação entre teoria e prática não é uma relação de causa e efeito, e precisa ser continuamente explorada para alcançar a eficácia e a satisfação daquele que solicitou o serviço ou que espera que você realize determinada tarefa.
Ao debruçar sobre o texto fica clara a expectativa de que a tarefa ou serviço que foi cofiado ao profissional deva ser realizada no tempo e no modo avençados. A qualidade da execução passa também pela satisfação do cliente: Ele, cliente, é “o primeiro e direto interessado e merece reciprocidade de confiança, pois, ao procurar o profissional, já nele depositou fé” (141).
Mas o que fazer quando o ambiente, organização ou sistema hierárquico pretenda interferir na possibilidade de escolha do profissional no que tange às suas práticas? Ao nosso ver, o autor resolve a indagação baseando-se em caso citado por Cícero: “o dever muda de acordo com a circunstância, mas não deixou de atribuir ao caso o caráter de excepcionalidade. Ele resumia as virtudes nos sentimentos de: 1) busca de verdade; 2) preservação da sociedade ou coletivo; 3) moderação; e 4) temperança” (144).
Esses sentimentos corroboram para aproximação da ideia de que o exercício profissional deva considerar a relação social, ou seja, trabalho para servir outro. Como decorrência, obtemos o suprimento de nossas necessidades. Desta forma, segundo Sá, o trabalho é um dever social e renuncia o forte egoísmo, buscando uma felicidade global. Há concretização de uma consciência holística: “se cada um fizer sua parte, para melhoria da consciência coletiva de sua categoria e da nação, estará fazendo tudo para que se alcancem dias melhores” (145). Em cada instância de trabalho, ou ambiência, serão requeridas condutas condizentes a este estado de consciência que prefere o bem, a excelência. Há uma denúncia acerca do problema que ocorre entre as diferentes instâncias de relações, que podemos sintetizar em: empregado, autônomo e sócio.
O empregado está comprometido hierarquicamente, enquanto o autônomo exerce sua liberdade de escolha, pois responde por seus compromissos assumidos. Com relação ao sócio passa a ter sua vontade associada às decisões de uma coletividade. “Quanto maior a empresa profissional, tanto menos o sócio tende a exercer, genuinamente, sua vontade”(148). “A tendência é que quanto mais impessoal tornar-se o processo da decisão e tanto menos ética é possível que venha a ser a conduta, se um sistema rígido de normas não obrigar à prática da virtude”(149). Independentemente da situação em que se encontre o profissional, não há conduta que não seja praticada por homem. Logo, quem age, age sob sua própria escolha, segundo suas virtudes pessoais. Aquele que é íntegro, segundo sua integridade. “O ambiente de trabalho pode, pois modificar e influir sobre a atuação do ser humano, seja qual for a função que exerça, mas a conduta só terá teor ético se for virtuosa em si” (150).
Neste talante, o autor destaca as virtudes básicas relacionadas aos profissionais, geralmente aplicáveis e requeridas em quase todas as profissões. São elas:
1) zelo – está relacionado com o cuidado, com a responsabilidade individual entre sujeito e objeto de trabalho. Está presente na opção que o profissional tem de aceitar ou não a tarefa, no caso expresso dos autônomos. O profissional que age zelosamente terá o cuidado para agir com excelência, não se justificando “o descaso, o desinteresse, a procrastinação (que são ausências de zelo), porque o cliente é pequeno ou porque não tem condições de remunerar melhor o profissional” (165). O trabalho zeloso tem menos a ver com dinheiro e mais com virtuosidade.;
2) Honestidade – a honestidade toca a responsabilidade perante o bem e a felicidade de terceiros. Quando se utiliza o status ou posição profissional para se auferir vantagem sobre o outro, através de suborno, corrupção, e outros desvios de caráter, expõem-se o bem e o outro à insegurança, difundindo a quebra da probidade. Honestidade repercute em mim, mas também repercute no outro. Cobrar adequadamente pelo serviço é ser honesto. Saber fazer a tarefa que se propõe é sinal de honestidade.
3) Sigilo – está relacionado com respeito e confiança. Muitas atividades dependem que seu modus operandi seja reservado à empresa ou instituição. Por isso, age virtuosamente quem guarda a informação para si quando lhe é solicitado, sob pena de ser considerada traidora assumindo sobre si as conseqüências administrativas e penais. Aquele que tem acesso a informações bancárias não pode revelar senão expressamente constrangido por determinação legal. Da mesma forma o profissional de criação de marketing e propaganda será severamente sancionado ao divulgar lançamento de determinada campanha publicitária; e
4) competência – espera-se que o profissional possua o conhecimento acumulado e as habilidades para o desempenho da tarefa. É a concretização da teoria que se cristaliza na experiência prática. Essa experiência reduz e/ou elimina a imperícia do profissional. Espera-se que o profissional seja orientado pelo aprendizado contínuo para colocar à disposição daquele que lhe solicitou os serviços o que há de mais atual em termos de recursos e teorias pertinentes à tarefa. O conhecimento deve ser utilizado sempre para consecução do bem e nunca para ludibriar o utente ou para favorecer o mau uso da competência. A incompetência é lesiva à ética.
Por todo o exposto, o profissional além de conhecer e executar bem sua tarefa deve zelar por virtudes de honestidade, transparência, verdade, lealdade. As virtudes éticas inspiram comportamentos, porém, não os determina, ficando sob o livre arbítrio do profissional a escolha da conduta. Percebe-se que cada profissão, tem sua especificidade, independente se o profissional gosta ou não do que faz, “ser um profissional ético é realizar seu trabalho sem prejudicar seus pares. Sendo assim, (…) “a profissão não deve ser um meio, apenas, de ganhar pela vida, mas de ganhar pela vida que ela proporciona, representando um propósito de fé” (138). A Ética se coloca como um questionamento sobre o agir, uma reflexão sobre o que é preciso fazer, uma procura pelo que é bom ou justo. O zelo, a competência, a honestidade e o sigilo são elementos imprescindíveis para um profissional ético, que busca cooperar para uma relação profissional melhor e, conseqüentemente, um mundo melhor. Este é um bem que todos devem almejar.



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